Atrasado

“O tempo passa, o tempo voa, e a poupança Bamerindus continua numa boa!”. Com este bordão, o Banco Bamerindus (que já não existe!) sustentava o reclame (ui, que antigo!) de sua caderneta de poupança nos canais de rádio e televisão Brasil afora. A ideia de tempo é que me traz aqui, hoje. Em tempo (ops!), vai, por tabela, uma homenagem a minha amiga Sofia, que criou o grupo de teatro “Lusco-fusco”, na/da Faculdade de Filosofia, da Universidade de Zagreb. Sua última apresentação, um dia antes de meu retorno quase épico (Sou exagerado e o epíteto se refere apenas ao tempo gasto no retorno e suas peripécias, dado que eu estava nas mãos de três companhias aéreas até recolocar meus pés na terra brasilis) para o Brasil, foi o remake de sua primeira peça Aqui, hoje. Esta última encenação, atualizada em suas referências, chamou-se Ali, amanhã. O título remete, coincidentemente, à ideia que tenho do meu encontro com esta portuguesa adorável, a Sofia. Eu sei que “ali” (em referência a qualquer lugar no/do planeta), “amanhã” (agora a referência é ao momento que vai ser qualquer um, quase inesperado) a gente vai se encontrar de novo. Bem… o tempo passa e com ele as lembranças. Com a “febre nacionalista” deflagrada com os prélios ludopédicos que têm lugar na África do Sul, nos dias que correm, lembrei-me da emocionante entrada de Antonio Candido, sobraçado por Cleonice Berardinelli, no auditório da congregação, na UFRJ, alguns anos atrás. Emocionante para mim, pois ali estavam duas figuras míticas no horizonte de expectativas de quem gosta de literatura, como eu. Ele, pela contribuuição insofismável ao processo de investigação e inquirição acerca do processo histórico de constituição do que se costumou chamar de “nacionalidade literária”. Ela, pela co-fundação dos estudos de Literatura Portuguesa no Brasil. Ela foi da primeira turma do curso de Letras da Universidade de São Paulo, iluminada por mentes igualmente iluminadas de portugueses aqui exilados por força da brutal ignorância do ditador Salasar (ou será Salazar? Estou com preguiça de consultar agora: vai assim mesmo!). Pois os dois octogenários desfilaram pelo corredor central da sala da congregação, sob aplausos efusivos e algumas lágrimas de pura admiração, as minhas, inclusas! Ela hoje é membro efetivo da Academia Brasileira de Letras. No jargão corrente, ela é imortal. Já era assim para seus alunos e amigos, parentes, chegados e admiradores. Tive a felicidade de entrevistá-la em sua casa, numa tarde outonal, no Rio de Janeiro: uma delícia. Em certa passagem, na abertura de um dos congresso da Associação Brasileira de Professores de Literatura Portugfuesa, em Niteroi, ela foi convidada para a conferência de abertura, numa espécie de homenageme especular a ela mesma (o congresso foi esta homenagem). O orador que a apresentava disse que, diante de nós, estavam quase 80 anos de Literatura Portuguesa. Tomando a palavra, num piparote divertido, Dona Cleo, corrigiu seu apresentador, refazendo as contas e comprovando que, na verdade o tempo contava um pouco mais de cem anos. Risos e aplausos, como se ourviram ao final de sua prédica, sempre clara, doce e firme. Essas recordações, um tanto antigas, e a homenagem atrasada pelo acolhimento desta doce senhora pela ABL, vieram à mente com as notícias sobre a morte de Saramago e sua sequêncìa, nos cenários português e internacional. Mais uma vez, a própria vida nos ensina que “o tempo passa, o tempo voa”… As outras glórias são total e absolutamente vãs…

2 respostas para “Atrasado”

  1. Saborosíssima esta postagem: pelas memórias, pelos vocábulos cuidadosamente escolhidos, os de ontem e os de hoje, e pela alegria nas entrelinhas, apesar do luto por Saramago: a volta ao Brasil vai lhe fazendo um imenso bem! E eu… tô feliiiiiiz! Já falei isso, não? hehehehe Bjs carinhosos

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