Sou leitor contumaz da coluna da Dad Squarisi, no Estado de Minas. Fã de carteirinha. Isso não me obriga a ficar de boca fechada. Ainda mais depois de ler duas de suas colunas. Fiquei deveras incomodado, não tanto pelo “conteúdo”, mas pelo “tom” do discurso. Para dar tratos à bola, fui apondo meus comentários (em negrito vermelho) sobre as assertivas da “jornalista e linguista” (?). Nada pessoal… O texto é longo, contradizendo alguns dos “princípios” nele exarados…
Mídias convergentes? Que bicho é esse?
Dad Squarisi
É mídias convergentes pra lá, mídias convergentes pra cá. Os suplementos de informática não se cansam de falar no assunto. Debates calorosos incendeiam universitários e professores de comunicação. Os Diários Associados puseram lenha na fogueira. Lançaram o Manual de redação e estilo para mídias convergentes. “Que bicho é esse?”, perguntam leitores curiosos. (É o bicho que pega e come quem não tece educação primária e ginasial que ensinava a ler e a escrever!)
O manual dos Diários Associados ajuda na resposta. A questão tem tudo a ver com a internet. A rede de computadores se parece com aquelas bonecas russas metidas uma dentro das outras. Conhece? A grande mãe é a web. Nela há de tudo—jornais, blogues, sites, portais, livros, revistas, enciclopédias, rádios, tevês, fotos, filmes, músicas. A matriarca virou o mundo da escrita e da leitura pelo avesso. (Será que virou mesmo? Ou isso é invenção de quem quer se livrar da “obrigação” de ler e escrever “corretamente”?) Quem escreve tem de ter em mente que o texto pode ter destinos muiiiiiiiiiiiiiito diferentes dos originais. (Os destinos da leitura sempre foram “muiiiiiiiiiiiiiito” diferentes… Qual a “novidade”??? E, por falar nisso, que destinos “originais” são esses???)
Redações escolares, provas de concurso, sentenças judiciais, artigos de jornal, discursos políticos, publicações do Diário Oficial—tudo alça voo. Podem ser lidos por um locutor e virar podcasts. Podem ser postados na internet. Podem ser vertidos automaticamente para outras línguas graças ao Google Translator. Eis o desafio: a linguagem original tem de estar atenta à nova realidade. (Estar atenta é uma coisa… submeter-se cegamente é outra bem diferente. Bem menos racional e/ou saudável!)
Admirável criatura nova
A relação autor-leitor se divide em dois tempos—antes da internet e depois da internet.(Quanta pretensão!) Antes da internet, o autor era dono e senhor do texto. (Isso é relativo… basta ler um ou dois volumes de História da leitura para verificar! mas é preciso LER!!!) Definia a introdução, as trilhas do desenvolvimento, a hora da conclusão. (E continua assim: alerta para os desavisados de plantão!) O leitor recebia o prato pronto. (O prato pode até estar pronto, mas quem o “come” é o leitor. Sempre foi assim, sempre será!!!) Ou o consumia, ou o deixava de lado. (E mudou alguma coisa? O sujeito pode ligar ou desligar o computador quando quiser, uai!) Nada mais podia fazer contra a ditadura da linearidade imposta pela página escrita. (Impor o inverso do que está posto não é a mesma ditadura?)
Depois da internet, a história mudou de enredo. (Será que “mudou” tanto assim mesmo?) A ordem perdeu o rumo. (Perdeu não… Não é bem assim…) O caminhar em linha reta deu a vez ao navegar. (E quem disse que LER é caminhar em linha reta?) Imprevisibilidade é a tônica. (Cadê a novidade?) Trechos de texto se intercalam com referências a outras páginas. (Uai… nos “textos” é do mesmo jeito!) Um clicar muda a sequência, o código, o enfoque. (Virar a página também!) O leitor assume o protagonismo. (Ele jamais foi alijado de seu “protagonismo”!) Escolhe o que ler, quando ler, por onde começar, onde interromper, em que hora parar. (De novo, a mesma cantilena…)
A planura da folha de papel cedeu o lugar a espaço plural. (A folha de papel, para a LEITURA jamais foi “plana”…) Ali o internauta tem acesso simultâneo a textos, imagens, vídeos, sons, animação. (Esta sim pode ser uma vantagem, um “avanço” uma vantagem: saudades de Italo Calvino!) Mais: pode brincar com eles. (Quem disse que o “papel” não é lúdico?) Modifica-os, reorganiza-os, interage com um, dois ou todos. (Tsk… tsk… tsk…) Em suma: rege os elementos da comunicação. (Hello!) Tanto poder gerou uma admirável criatura. (O sujeito que LÊ já é esta admirável criatura!) Conhecê-la é preciso. (Sempre foi. Continua sendo. Sempre será.) Dá senhora ajuda a quem quer escrever para ser lido. (“Há mais coisas entre o céu e aterra…”)
O internauta é…
Infiel: não comparece diariamente (O que é “comparecer diariamente”?) nem deixa de borboletear de site em site, de blogue em blogue. (É o mesmo que dizer “De página em página”…)
Inconstante: passa pelo site, mas não o lê com assiduidade. (Inconstância não é predicado de um LEITOR)
Proativo: busca mais informações em vez de aceitar passivamente o que lhe é oferecido. (LER é dialogar, não é resignar-se)
Arisco: não se deixa agarrar com facilidade. (Quem disse que o LEITOR não é assim?)
Receptivo: aprecia estilos não convencionais porque tropeça em muitas mesmices. (Não vejo diferença…)
Crítico: gosta de comentar a matéria. Elogia, desqualifica, faz sugestões. (Ô gente… Não é isso mesmo o que o LEITOR faz???!!!)
Exigente: quer ser ouvido, seja coma publicação do comentário, seja coma resposta rápida à pergunta que formula. (Todo e qualquer LEITOR é exatamente assim!)
Visual: faz a primeira avaliação com os olhos. A matéria tem de caber na tela do computador. (Isso me parece cerceamento e/ou amputação)
Multimídia: não aprecia notícias com cara das lidas no jornal. (O que há de errado, de mau, com elas?) Além de texto e imagens, exige vídeos, áudios, animação. (Essa “exigência” é que me incomoda por despótica que me parece) Nada de prato feito. (Um texto não é prato feito é cardápio variado!) Ele escolhe a ordem. (A LEITURA também!)
Apressado: falta-lhe tempo para abarcar o universo sem fim da web. Lê o texto em T—primeiro o título. Depois, as primeiras palavras do 1º parágrafo. Se quiser, prossegue. Só chega ao fim se lhe interessar. (Deixando de lado a mesmice repetitiva, o tempo é que é o dodói aqui… LER é mesmo prática que demanda tempo… para APROFUNDAMENTO NECESSÁRIO!)
Em bom português
As mídias eletrônicas viraram pelo avesso a função do autor escritor e a do usuário-leitor. (Essa virada é meramente mecânica, logística… O processo e a organicidade ainda são os mesmos!) Adeus, posse e autoria de um texto fisicamente ilhado. (O TEXTO jamais foi uma ilha!) Adeus, significado único e hierarquicamente superior aos comentários e notas que dizem respeito a ele. (Deus, quanta superficialidade… Ler qualquer texto “físico” é ter que se submeter a esses mesmos parâmetros ditos “inovadores”!!!) Adeus, poder absoluto. (Poder absoluto não “existe”. Quem ainda não ouviu falar em Foucault?)