Quase 35 anos depois ela está viva. Vivíssima. Eu diria que, praticamente, reencarnada na pele de uma atriz que, como se diz por aí: deu conta do recado. Apesar dos lábios mais carnudos e um ou outro detalhe “técnico”, o desenho da atriz faz mais que jus à artista, a cantora, a mulher, ao mito: Elis Regina. Quase 35 anos e eu ainda me lembro daquela tarde de janeiro quando, voltando do intervalo do almoço, entrei na loja em que trabalhava e escutei no rádio a notícia triste. Os funcionários da oficina de reparos de móveis me ouviram chegar e subiram e, condoídos, tristes, cabisbaixos, vieram trazendo o rádio e me abraçaram como se eu fosse parente próximo da “Pimentinha”. Elis tinha sido encontrada morta em seu apartamento em São Paulo. Semanas depois, uma conhecida minha de Belo Horizonte dizia-me te visitado um amigo dela, muito próximo da Elis, que, segundo a minha conhecida, teria sido o sujeito que levou a cocaína que a Elis misturou com vermouth na golada fatal. Dizia, então, a amiga que sujeito estava arrasado, sentindo-se responsável… O filme, faz sóbria homenagem na referência ao episódio final. O relance do nome de Milton Nascimento (que aparee na lombada de uma fita cassste e cuja voz se ouve, ao fundo, num solfejo delicado) é de uma elegância que faz ter vontade de quebrar a cara do capista da revista ISTOÉ que estampava de braços abertos, como num crucifixo. A manchete era horrorosa, tendenciosa e absolutamente deselegante. Uma gafe imperdoável para uma pessoa do quilate da cantora gaúcha. Andreia Horta impressiona. Mais que impressiona, consegue, galhardamente, encarnar a insubstituível Elis. Sim, insubstituível. Diz o adagiário popular que ninguém é insubstituível. Desculpe o autor do aforisma, mas Elis É insubstituível!!! A trilha sonora do filme é impecável. A fotografia leva a audiência a confundir Elis e Andreia, confundir Andreia e Elis. Há momentos em que é praticamente impossível dizer quem é quem. Exagero de fã? Pode ser, mas sincero. O respaldo está na produção que conseguiu pontuar momentos chave na trajetória daquela que deu uma guinada de 180º na música popular brasileira – claro que faltou muita coisa, para cada um de nós há detalhe que poderia ser acrescentado, como o desenho do Henfil, não o que é mostrado no filme, mas outro, o que foi publicado quando de sua morte, como numa condolência suplicante do cartunista. O filme, um tour de force admirável e consequente, esmerado, sincero, elegante, mais que bom. O eixo de referência da cultura musical brasileira não apenas deve muito a Elis, não teria tido a história que teve não fosse ela. Elis, a mulher. Elis, a cantora, a mãe, a artista. E também a Andreia: que sensibilidade, que entrega, que identificação. Acabei de ver o filme, ainda sinto o calor da hora, o coração selvagem do qual cheguei perto, uma vez mais, ao som da voz da Elis e da pele de Andreia. Gostei!
2 respostas para “Mito”
Felizmente, em ambos os países, temos um excelente gerações de novos talentos!
Puxa! Me deu uma vontade apressada de ver o filme, tal a sua emoção. Também me apaixonei por Elis desde os tempos em que começou junto com Jair Rodrigues: ela era um FENÔMENO absolutamente novo e fervilhante demais. Não perdia um programa. Que bom que alguém teve a brilhante ideia de deixar um registro imagético de sua rápida e impressionante passagem pelo planetinha azul. Valeu a sua sinopse emocionada. Beijinho.